Pular para o conteúdo principal

Licença Maternidade ao Pai Viúvo: Possibilidade!

Viúvo, pai de recém-nascido, obtém licença maternidade
Por Rafael Baliardo

Um servidor da Polícia Federal em Brasília conquistou na Justiça o direito de gozar da licença paternidade nos moldes da licença maternidade, depois que teve indeferida a concessão administrativa. O pedido foi feito porque a sua mulher morreu por complicações durante o parto do filho.

A juíza Ivani Silva da Luz, da 6ª Vara Federal do Distrito Federal, acatou, na quarta-feira (8/2), o pedido liminar em Mandado de Segurança ajuizado contra o ato da coordenadora substituta de Recursos Humanos do Departamento de Polícia Federal, que recusou a solicitação administrativa feita pelo funcionário.

O impetrante tem, portanto, o direito de desfrutar da licença paternidade nos moldes da licença maternidade, como prevista no artigo 207 da Lei 8.112/90, combinado com o artigo 2º, parágrafo 1º, do Decreto 6.690/08.

O primeiro dispositivo prevê que será concedida licença à servidora gestante por 120 dias consecutivos, sem prejuízo da remuneração. O segundo diz que serão beneficiados pelo Programa de Prorrogação de Licença à Gestante e à Adotante as servidoras públicas federais e o artigo 2º diz que a prorrogação do prazo deve se iniciar no dia subsequente ao término da vigência prevista.

Depois da morte da mulher em janeiro último, José Joaquim dos Santos, viúvo e único responsável por um bebê recém-nascido e pela filha de 10 anos, não viu alternativa além de requerer administrativamente a concessão de licença de adoção, a fim de dispor de tempo para cuidar, de modo apropriado, dos filhos e se recuperar da perda no plano pessoal. A requisição foi indeferida pela coordenadora substituta do Departamento de Recursos Humanos da Polícia Federal em Brasília.

Frente à recusa, Santos, então, solicitou o gozo de suas férias, que encerraram justamente na quarta-feira (8/2). Antes do prazo se encerrar, ele resolveu buscar seus direitos na Justiça.

De acordo com os advogados Miguel Rodrigues Nunes Neto e Joaquim Pedro de Medeiros Rodrigues, do escritório Abreu, Nunes & Rodrigues Advogados, embora se saiba de casos análogos, ainda são desconhecidos os precedentes de uma decisão como esta. “Fora o caso de um Mandado de Injunção que ainda não foi julgado no Supremo e a decisão favorável a um casal homossexual que obteve a licença de adoção, desconhecemos, até o momento, os precedentes de se autorizar o benefício a um pai viúvo”, disse Nunes Neto, que coordenou os trabalhos de representação do servidor, à ConJur.

“Embora não exista previsão legal e constitucional de licença paternidade nos moldes de licença maternidade, esta não deve ser negada ao genitor, ora impetrante”, escreveu a juíza no texto que ampara a decisão. “Isto porque o fundamento deste direito é proporcionar à mãe o período de tempo integral com a criança, possibilitando que sejam dispensados a ela todos os cuidados essenciais, a sua sobrevivência e o seu desenvolvimento”, afirmou.

A justificativa apresentada pela coordenadoria dos Recursos Humanos da PF para o indeferimento da solicitação de licença-adotante foi, basicamente, que o funcionário não é do sexo feminino e não adotou criança alguma. Para tanto, o despacho da coordenadoria citava o artigo 210 da Lei 8.112/1990: “A servidora que adotar ou obtiver guarda judicial de criança de até 1(um) ano de idade, serão concedidos 90 (noventa) dias de licença maternidade.”

Para a coordenadoria de RH da PF, o fato do requerente ser do sexo masculino já o excluía, por definição, do benefício. “Observa-se no presente caso, que diferentemente, daquele analisado pela Justiça, o servidor é o pai das crianças, ou seja, não se pode aplicar, para o presente caso, o instituto da adoção por analogia”, afirma o despacho que indeferiu a solicitação do servidor.

Direitos fundamentais
Os advogados do servidor criticaram, contudo, a ocorrência de recusa apenas pelo princípio de “ausência de previsão legal expressa”, argumentando, para tanto, que “a proteção à infância é um direito social inserido no rol dos direitos fundamentais”. A juíza também avaliou que “nestas circunstâncias, os princípios da dignidade da pessoa humana e da proteção à infância devem preponderar sobre a legalidade estrita, que concede tão somente às mulheres o direito de gozo da licença maternidade”, escreveu.

“Por essas razões é que a Constituição Federal estabeleceu no artigo 226 que ‘a família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado’ e elencou no rol de direitos sociais do artigo 7º o direito à 'licença gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com duração de 120 dias e a licença paternidade, nos termos fixados em lei’”, escreveu a juíza Ivani Silva da Luz.

Depois de usar suas férias para ficar junto dos filhos, com a decisão, o servidor tem ainda o direito de afastamento remunerado por 180 dias contados retroativamente desde a data do parto. São 120 dias correspondentes ao modelo de “licença maternidade pura” e, portanto, também outros 60 referentes à prorrogação prevista pelo Decreto 6.690/08.

"Este é um importante precedente que antecipa o julgamento do Mandado de Injunção 4.408, que está tramitando no STF, e que corrige uma histórica injustiça legislativa, que desprestigiou a atual função paterna, especialmente nesses casos de falecimento pós-parto", avaliou o advogado Joaquim Pedro.

Clique aqui para ler a sentença.

Fonte: Conjur

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

STJ e o reconhecimento do tráfico privilegiado

Sem constatar adequada motivação para o afastamento do tráfico privilegiado — causa de diminuição de pena voltada àqueles que não se dedicam a atividade ilícita —, o ministro João Otávio de Noronha, do Superior Tribunal de Justiça, concedeu de ofício ordem de Habeas Corpus para reconhecer o direito de um condenado à minorante da sua pena. O magistrado determinou que o juízo de primeiro grau refaça a dosimetria da pena de acordo com tais premissas, bem como analise o regime inicial mais adequado à nova punição e a possibilidade de conversão da pena em restritiva de direitos. O homem foi condenado a sete anos e seis meses de prisão em regime fechado, além de 750 dias-multa, pela prática de tráfico de drogas. A pena-base foi aumentada levando-se em conta a quantidade de droga apreendida (157 quilos de maconha), o que levou à presunção de dedicação a atividades criminosas. O Tribunal de Justiça de São Paulo manteve a decisão, que transitou em julgado. O ministro relator lembr...

Lugar do crime: teoria da ubiquidade (CP) ou do resultado (CPP)?

Eudes Quintino de Oliveira Junior Muitas vezes, ao se analisar os dispositivos contidos em nossa legislação (sejam de direto material ou processual), verifica-se que há regras aparentemente distintas e contraditórias, o que fatalmente acarreta uma série de dúvidas aos operadores do Direito, sem falar ainda dos estudantes do bacharelado e dos concursos públicos. Com efeito, dispõe o artigo 6º, do CP, que: considera-se praticado o crime no momento da ação, ou da omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado. Já o artigo 70, do CPP, diz que a competência será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a infração, ou , no caso de tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato de execução. Pois bem, está caracterizada a aparente antinomia na área penal, em tema de lugar do crime. Os ventos são indicadores de furacão nos mares do sul. O CP diz que deve se considerar, como local onde praticada a infração penal, o lugar onde t...

Novo padrão probatório para testemunho policial em condenações criminais

Há tempos consolidou-se em nossos tribunais o entendimento pela validade dos depoimentos prestados por agentes estatais, havendo inclusive julgados afirmando que mereceriam maior crédito porque prestados por servidores, no exercício de suas funções. Entretanto, recentes decisões judiciais têm causado alteração no padrão de provas anteriormente exigido apontando no sentido de que as palavras dos policiais, como toda prova testemunhal, são passíveis de falhas, o que  recomenda (ou exige) a adoção, por parte do Estado, de cautelas maiores que a de simplesmente carrear à defesa o ônus de comprovar a parcialidade do agente ou de equívoco fático em seu testemunho. Não se pretende aqui colocar em xeque indistintamente a idoneidade dos agentes estatais, mas apenas apontar que a falibilidade de nossa memória e, portanto, da prova testemunhal em si, recomenda, como padrão probatório mínimo a fundamentar condenações criminais, a exigência de elementos outros, antes impossíveis devido ao "est...