Pular para o conteúdo principal

STJ: Sem prova de envolvimento "estável" com tráfico, ré tem pena reduzida

A ministra Laurita Vaz, do Superior Tribunal de Justiça, aceitou parcialmente o pedido de Habeas Corpus feito pela defesa de uma mulher de Santa Catarina que havia sido condenada por associação para o tráfico mesmo sem indicação concreta de que estaria envolvida "de forma estável e permanente" com as atividades criminosas do marido.

Com isso, a pena da mulher foi reduzida de cinco anos e dez meses de reclusão para um ano e oito meses, com regime inicial aberto. A decisão alterou sentença do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJ-SC).

O caso aconteceu em janeiro de 2020, na cidade de Brusque, no Vale do Itajaí. O casal foi denunciado por tráfico de drogas e associação para o tráfico em virtude da apreensão de 29 gramas de cocaína, 12 gramas de MDMA (popularmente conhecida como "droga do amor") e 85 gramas de maconha.

O TJ-SC entendeu que havia provas suficientes para concluir que a mulher estava associada às atividades de tráfico do marido. No entanto, segundo a ministra Laurita Vaz, relatora do pedido de Habeas Corpus da ré no STJ, não houve "indicação concreta" de que a acusada estava associada de forma estável e permanente às atividades do corréu.

"Observo que foi demonstrada, na espécie, tão somente a configuração de delito de tráfico de drogas em concurso eventual de agentes, não tendo havido a descrição de fatos que demonstrassem o dolo e a existência objetiva de vínculo estável e permanente entre os agentes", avaliou a magistrada.

Laurita Vaz explicou que o entendimento do STJ é de que é "necessária a demonstração da estabilidade e permanência da associação" para a condenação por associação para o tráfico, e que "a reunião ocasional de duas ou mais pessoas” não configura associação criminosa.

"Nesse contexto, sem a indicação concreta do ânimo da acusada de associar-se de forma estável e permanente com o corréu, mostra-se indevida a condenação pelo delito tipificado no art. 35 da Lei nº 11.343/2006".

Redução da pena
Pelo fato de a mulher ser primária, ter bons antecedentes e não se dedicar a atividades criminosas, sua pena foi reduzida.

Além disso, levando em conta que a nova dosimetria estabeleceu pena inferior a quatro anos e não havia circunstâncias judiciais negativas ou "quantidade substancial" de droga apreendida, a relatora decidiu que o regime inicial de cumprimento de pena adequado para o caso é o aberto, nos termos do artigo 33, §§2º e 3º, c.c. o artigo 59, ambos do Código Penal.

Também foram substituídas as penas privativas de liberdade por duas restritivas de direitos, a serem especificadas pelo juízo das execuções criminais. 

O caso contou com patrocínio dos advogados Osvaldo Jose DunckeLucete Adriana EgerCarolina Gevaerd LuizMatheus Paranhos Menna de Oliveira e Dáviner Bruno Medeiros Júnior, todos de Santa Catarina. 

Clique AQUI para ler a decisão
HC 745.789


Por Camila Mazzotto
Fonte: Conjur

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

STJ e o reconhecimento do tráfico privilegiado

Sem constatar adequada motivação para o afastamento do tráfico privilegiado — causa de diminuição de pena voltada àqueles que não se dedicam a atividade ilícita —, o ministro João Otávio de Noronha, do Superior Tribunal de Justiça, concedeu de ofício ordem de Habeas Corpus para reconhecer o direito de um condenado à minorante da sua pena. O magistrado determinou que o juízo de primeiro grau refaça a dosimetria da pena de acordo com tais premissas, bem como analise o regime inicial mais adequado à nova punição e a possibilidade de conversão da pena em restritiva de direitos. O homem foi condenado a sete anos e seis meses de prisão em regime fechado, além de 750 dias-multa, pela prática de tráfico de drogas. A pena-base foi aumentada levando-se em conta a quantidade de droga apreendida (157 quilos de maconha), o que levou à presunção de dedicação a atividades criminosas. O Tribunal de Justiça de São Paulo manteve a decisão, que transitou em julgado. O ministro relator lembr...

Lugar do crime: teoria da ubiquidade (CP) ou do resultado (CPP)?

Eudes Quintino de Oliveira Junior Muitas vezes, ao se analisar os dispositivos contidos em nossa legislação (sejam de direto material ou processual), verifica-se que há regras aparentemente distintas e contraditórias, o que fatalmente acarreta uma série de dúvidas aos operadores do Direito, sem falar ainda dos estudantes do bacharelado e dos concursos públicos. Com efeito, dispõe o artigo 6º, do CP, que: considera-se praticado o crime no momento da ação, ou da omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado. Já o artigo 70, do CPP, diz que a competência será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a infração, ou , no caso de tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato de execução. Pois bem, está caracterizada a aparente antinomia na área penal, em tema de lugar do crime. Os ventos são indicadores de furacão nos mares do sul. O CP diz que deve se considerar, como local onde praticada a infração penal, o lugar onde t...

Novo padrão probatório para testemunho policial em condenações criminais

Há tempos consolidou-se em nossos tribunais o entendimento pela validade dos depoimentos prestados por agentes estatais, havendo inclusive julgados afirmando que mereceriam maior crédito porque prestados por servidores, no exercício de suas funções. Entretanto, recentes decisões judiciais têm causado alteração no padrão de provas anteriormente exigido apontando no sentido de que as palavras dos policiais, como toda prova testemunhal, são passíveis de falhas, o que  recomenda (ou exige) a adoção, por parte do Estado, de cautelas maiores que a de simplesmente carrear à defesa o ônus de comprovar a parcialidade do agente ou de equívoco fático em seu testemunho. Não se pretende aqui colocar em xeque indistintamente a idoneidade dos agentes estatais, mas apenas apontar que a falibilidade de nossa memória e, portanto, da prova testemunhal em si, recomenda, como padrão probatório mínimo a fundamentar condenações criminais, a exigência de elementos outros, antes impossíveis devido ao "est...