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STJ: Procedimento de reconhecimento pode ser dispensado se vítima tiver certeza

O reconhecimento pessoal do acusado de um crime deve seguir o procedimento previsto no artigo 226 do Código de Processo Penal quando houver dúvida sobre a identificação do mesmo. Se a vítima é capaz de individualizar o suposto autor da conduta, ele pode ser dispensado.

Com esse entendimento, a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça negou a ordem em Habeas Corpus ajuizado por um homem condenado pelo roubo de R$ 5 mil, após ser identificado em fotos no Facebook e reconhecido pessoalmente em juízo.

A defesa alegou que o reconhecimento na fase de inquérito não observou o rito do artigo 226 do CPP, que prevê que a descrição do autor do crime seja feita vítima e que o suspeito seja colocado ao lado de outras pessoas, se possível com alguma semelhança física.

No caso, a vítima combinou a compra de um carro anunciado no Facebook, pelo valor de R$ 5 mil. Ao se dirigir ao local para fazer o pagamento, parou em um bar para pedir informações, onde foi assaltado por quatro pessoas, duas das quais estavam armadas.

A vítima então encontrou os suspeitos na página de amigos da pessoa que lhe venderia o carro e comunicou o ocorrido à Polícia. Em juízo, em audiência por videoconferência, reconheceu todos os denunciados e afirmou ter certeza de que foram eles os autores do crime.

Para a 6ª Turma, não há nada de errado com a condenação. Isso porque o artigo 226 do CPP prevê regras para "quando houver necessidade de fazer-se o reconhecimento de pessoa". Ou seja, ele incide quando existir alguma dúvida.

Relator, o ministro Sebastião Reis Júnior esclareceu que a recente orientação do STJ, no sentido de afastar condenações por reconhecimento pessoal feito fora das hipóteses do artigo 266 do CPP, buscou afastar foi a prática recorrente dos agentes de segurança pública de apresentar fotografias às vítimas, induzindo a determinadas conclusões.

"O reconhecimento de pessoa continua tendo espaço quando há necessidade, ou seja, dúvida quanto à individualização do suposto autor do fato. Trata-se do método legalmente previsto para, juridicamente, sanar dúvida quanto à autoria. Se a vítima é capaz de individualizar o agente, não é necessário instaurar a metodologia legal", explicou.

No caso, a identificação dos réus pelo Facebook foi apenas uma das circunstâncias do fato, já que a negociação do carro ocorreu pela rede social. "Isso não afastou o reconhecimento dos autores do fato em juízo, razão pela qual não há falar em violação do art. 226 do Código de Processo Penal", concluiu o relator.

O voto foi acompanhado pelos ministros Antonio Saldanha Palheiro e Laurita Vaz, e pelo desembargador convocado Olindo Menezes. Abriu a divergência e ficou vencido o ministro Rogerio Schietti.

Para ele, o que determinou a condenação foi o depoimento de uma das vítimas, que, por conta própria, buscou nas redes sociais e encontrou fotografias que a levaram a concluir pelo autor do crime.

"É muito temerário validar condenação por um crime grave tão somente a partir de uma avaliação subjetiva, ainda que da pessoa mais diretamente interessada, a respeito da autoria. Acho que seria preciso produzir alguma outra prova para dar lastro a essa condenação", disse.

HC 721.963


Por Danilo Vital
Fonte: Conjur

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