Pular para o conteúdo principal

Fofoca e entretenimento também são informação...

Pedro Canário

O direito à liberdade de imprensa não pode estar submetido a nenhum outro, desde que não prejudique a dignidade das pessoas. É o que pensa a ex-presidente do Tribunal Constitucional Federal da Alemanha, Jutta Limbach, ao explicar que toda informação deve ter liberdade plena de divulgação, "mesmo que seja fofoca", diz.

Jutta falou nesta terça-feira (25/10) na sede da seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil sobre os limites da liberdade de imprensa e até que ponto políticos e personalidades públicas devem aguentar críticas. Mas, para a constitucionalista, ao assumir um cargo público, a pessoa deve estar preparada para lidar com a curiosidade jornalística.

Segundo Jutta, a jurisprudência alemã prega que toda crítica deve ser permitida, a todo tempo. Isso, afirma, abrange tanto a crítica de caráter social e político quanto a ignorante, desinformada e até mesmo rude. "Os políticos alemães são muito sensíveis a isso, principalmente porque acabam comparados a seus antecessores do Nacional-Socialismo [movimento político alemão que originou o Nazismo]", lembra.

"Não podemos separar o que é informação de interesse público do que é fofoca. Eu também não entendo qual a importância da vida de Carolina de Mônaco para a sociedade, e me espanto com a importância que os jovens dão à aristocracia hoje em dia. Mas se passarmos a proibir a divulgação de determinado tipo de informação, entraremos no campo da censura", ensina.

E isso não diz respeito apenas a jornais e revistas. Jutta conta que o Tribunal Constitucional Federal da Alemanha levou em conta os meios digitais para fixar os limites da informação em seu país. "A liberdade de imprensa não se restringe à imprensa séria", resume e acrescenta que toda classificação prévia é forma de censura.

Questões continentais

Ao se referir à Carolina de Mônaco, Jutta Limbach citou os embates entre o Tribunal Constitucional alemão e o Tribunal de Direitos Humanos da Europa. Ela lembra de um caso específico: a imprensa europeia publicou reportagens que mostravam a princesa em viagem de esqui, enquanto seu pai, o rei, estava gravemente doente, acamado.

Para o tribunal europeu, a decisão é que a vida de Carolina não interessa ao público leitor, e a privacidade da princesa foi invadida com as reportagens. Mas, para o tribunal alemão, fofoca e entretenimento também são formas de informação.

Jutta também foi questionada durante a palestra. João Otávio Benevides Demasi, membro da Comissão de Relações Internacionais da OAB-SP, lembrou da relação entre a imprensa italiana o primeiro-ministro do país, Silvio Berlusconi, e suas famosas festas — apelidadas pelos jornalistas de "bunga bunga". A jurista afirma que este é mais um caso em que a imprensa usa de escândalos pessoais para abalar a popularidade política de um governante.

O mesmo, conta, aconteceu com o ex-presidente americano Bill Clinton, quando foi acusado de ter um caso com sua estagiária Monica Lewinsky. Nesses casos, defende, os jornalistas devem sempre gozar de liberdade, mas, caso se excedam em seu papel, devem dar satisfações — ainda que judiciais — depois.


Fonte: Conjur

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

STJ e o reconhecimento do tráfico privilegiado

Sem constatar adequada motivação para o afastamento do tráfico privilegiado — causa de diminuição de pena voltada àqueles que não se dedicam a atividade ilícita —, o ministro João Otávio de Noronha, do Superior Tribunal de Justiça, concedeu de ofício ordem de Habeas Corpus para reconhecer o direito de um condenado à minorante da sua pena. O magistrado determinou que o juízo de primeiro grau refaça a dosimetria da pena de acordo com tais premissas, bem como analise o regime inicial mais adequado à nova punição e a possibilidade de conversão da pena em restritiva de direitos. O homem foi condenado a sete anos e seis meses de prisão em regime fechado, além de 750 dias-multa, pela prática de tráfico de drogas. A pena-base foi aumentada levando-se em conta a quantidade de droga apreendida (157 quilos de maconha), o que levou à presunção de dedicação a atividades criminosas. O Tribunal de Justiça de São Paulo manteve a decisão, que transitou em julgado. O ministro relator lembr...

Lugar do crime: teoria da ubiquidade (CP) ou do resultado (CPP)?

Eudes Quintino de Oliveira Junior Muitas vezes, ao se analisar os dispositivos contidos em nossa legislação (sejam de direto material ou processual), verifica-se que há regras aparentemente distintas e contraditórias, o que fatalmente acarreta uma série de dúvidas aos operadores do Direito, sem falar ainda dos estudantes do bacharelado e dos concursos públicos. Com efeito, dispõe o artigo 6º, do CP, que: considera-se praticado o crime no momento da ação, ou da omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado. Já o artigo 70, do CPP, diz que a competência será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a infração, ou , no caso de tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato de execução. Pois bem, está caracterizada a aparente antinomia na área penal, em tema de lugar do crime. Os ventos são indicadores de furacão nos mares do sul. O CP diz que deve se considerar, como local onde praticada a infração penal, o lugar onde t...

Novo padrão probatório para testemunho policial em condenações criminais

Há tempos consolidou-se em nossos tribunais o entendimento pela validade dos depoimentos prestados por agentes estatais, havendo inclusive julgados afirmando que mereceriam maior crédito porque prestados por servidores, no exercício de suas funções. Entretanto, recentes decisões judiciais têm causado alteração no padrão de provas anteriormente exigido apontando no sentido de que as palavras dos policiais, como toda prova testemunhal, são passíveis de falhas, o que  recomenda (ou exige) a adoção, por parte do Estado, de cautelas maiores que a de simplesmente carrear à defesa o ônus de comprovar a parcialidade do agente ou de equívoco fático em seu testemunho. Não se pretende aqui colocar em xeque indistintamente a idoneidade dos agentes estatais, mas apenas apontar que a falibilidade de nossa memória e, portanto, da prova testemunhal em si, recomenda, como padrão probatório mínimo a fundamentar condenações criminais, a exigência de elementos outros, antes impossíveis devido ao "est...