Pular para o conteúdo principal

Provas obtidas por policial que se passou pelo réu ao telefone são ilícitas

Por constatar violação do sigilo das comunicações telefônicas e indução ao erro para a prisão em flagrante, a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça absolveu um homem condenado por tráfico de drogas com base em provas obtidas por um policial que se passou por ele em uma ligação por celular durante a abordagem.

Policiais rodoviários pararam o réu em uma rodovia na cidade de Vitória, mas não encontraram nada ilícito no seu veículo. Desconfiados de que ele seria um "batedor" do tráfico, eles o levaram ao interior da base. Foi então que o celular do suspeito tocou e um dos agentes atendeu a ligação passando-se pelo dono do aparelho.

Do outro lado da linha estava o corréu da ação, que dirigia um carro com drogas e queria saber se era seguro prosseguir. O policial respondeu afirmativamente e, em seguida, determinou a abordagem do veículo.

O réu foi condenado em primeira e segunda instâncias. A defesa alegou nulidade das provas, mas o Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul considerou que o procedimento do policial foi o meio encontrado para garantir o interesse público, em detrimento do direito individual à intimidade.

A corte estadual ainda aplicou a teoria da descoberta inevitável, com a ideia de que o curso natural dos acontecimentos levaria à apreensão das drogas de qualquer modo.

No STJ, o ministro relator, Rogerio Schietti Cruz, entendeu que a conduta do policial foi ilícita, pois não havia prisão em flagrante no momento do telefonema. "Não havia justificativa idônea nem mesmo para apreender o celular do réu, muito menos para o militar atender a ligação e, pior, passar-se por ele de forma ardilosa para induzir o corréu em erro", afirmou ele.

Para o magistrado, o agente teria feito uma "interceptação telefônica ativa", não prevista por lei, que comprometeu as provas obtidas. Ele citou precedente do STJ contrário à licitude das provas em uma situação semelhante.

Schietti também afastou a teoria da descoberta inevitável. "O desfecho poderia ter sido completamente diverso — fuga, desvio de rota, desfazimento das drogas etc. — se o militar não houvesse atendido a ligação e, fazendo-se passar pelo réu, garantido ao comparsa que ele poderia continuar sem receios por aquele caminho." 

Com informações da assessoria de imprensa do STJ.

Clique AQUI para ler o acórdão
HC 695.895


Fonte: Conjur

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

STJ e o reconhecimento do tráfico privilegiado

Sem constatar adequada motivação para o afastamento do tráfico privilegiado — causa de diminuição de pena voltada àqueles que não se dedicam a atividade ilícita —, o ministro João Otávio de Noronha, do Superior Tribunal de Justiça, concedeu de ofício ordem de Habeas Corpus para reconhecer o direito de um condenado à minorante da sua pena. O magistrado determinou que o juízo de primeiro grau refaça a dosimetria da pena de acordo com tais premissas, bem como analise o regime inicial mais adequado à nova punição e a possibilidade de conversão da pena em restritiva de direitos. O homem foi condenado a sete anos e seis meses de prisão em regime fechado, além de 750 dias-multa, pela prática de tráfico de drogas. A pena-base foi aumentada levando-se em conta a quantidade de droga apreendida (157 quilos de maconha), o que levou à presunção de dedicação a atividades criminosas. O Tribunal de Justiça de São Paulo manteve a decisão, que transitou em julgado. O ministro relator lembr...

Lugar do crime: teoria da ubiquidade (CP) ou do resultado (CPP)?

Eudes Quintino de Oliveira Junior Muitas vezes, ao se analisar os dispositivos contidos em nossa legislação (sejam de direto material ou processual), verifica-se que há regras aparentemente distintas e contraditórias, o que fatalmente acarreta uma série de dúvidas aos operadores do Direito, sem falar ainda dos estudantes do bacharelado e dos concursos públicos. Com efeito, dispõe o artigo 6º, do CP, que: considera-se praticado o crime no momento da ação, ou da omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado. Já o artigo 70, do CPP, diz que a competência será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a infração, ou , no caso de tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato de execução. Pois bem, está caracterizada a aparente antinomia na área penal, em tema de lugar do crime. Os ventos são indicadores de furacão nos mares do sul. O CP diz que deve se considerar, como local onde praticada a infração penal, o lugar onde t...

Novo padrão probatório para testemunho policial em condenações criminais

Há tempos consolidou-se em nossos tribunais o entendimento pela validade dos depoimentos prestados por agentes estatais, havendo inclusive julgados afirmando que mereceriam maior crédito porque prestados por servidores, no exercício de suas funções. Entretanto, recentes decisões judiciais têm causado alteração no padrão de provas anteriormente exigido apontando no sentido de que as palavras dos policiais, como toda prova testemunhal, são passíveis de falhas, o que  recomenda (ou exige) a adoção, por parte do Estado, de cautelas maiores que a de simplesmente carrear à defesa o ônus de comprovar a parcialidade do agente ou de equívoco fático em seu testemunho. Não se pretende aqui colocar em xeque indistintamente a idoneidade dos agentes estatais, mas apenas apontar que a falibilidade de nossa memória e, portanto, da prova testemunhal em si, recomenda, como padrão probatório mínimo a fundamentar condenações criminais, a exigência de elementos outros, antes impossíveis devido ao "est...