Pular para o conteúdo principal

Juiz anula apreensão de drogas feita após entrada sem autorização em domicílio

A situação de flagrante deve ser indicada ou deduzida pelas circunstâncias fáticas antes do ingresso da polícia no domicílio. Se não for assim, a entrada na residência se torna arbitrária e as garantias constitucionais são sacrificadas.

Com essa fundamentação, a 3ª Vara Criminal de Limeira (SP) anulou uma apreensão de drogas feita sem autorização na casa do réu, desclassificou a acusação de tráfico para o delito de posse de droga para consumo pessoal e aplicou somente a pena de advertência sobre os efeitos dos entorpecentes.

Na ocasião do flagrante, policiais militares estavam em patrulhamento e viram o réu na rua "em atitude suspeita". Ele tentou escapar repentinamente, o que motivou a abordagem. Foram encontradas cinco porções de maconha em sua posse.

Os PMs pediram o documento de identidade do acusado. Ele informou que estava na sua residência. Os agentes, então, foram até o local, ingressaram no imóvel e encontraram mais 61 porções de maconha, cinco microtubos de cocaína e 98 pedras de crack.

O ingresso no domicílio foi justificado pelos policiais com base em uma declaração da mãe do réu. No entanto, a defesa alegou que ela foi induzida a erro pelos PMs. A mulher não sabia ler, mas eles lhe mostraram um documento e disseram que se referia somente à ocorrência, e não à autorização para entrada na residência.

Conforme o juiz Rafael da Cruz Gouveia Linardi, o fato de os policiais terem acompanhado o acusado até sua residência não implicaria em "autorização para que vasculhassem o ambiente à procura de ilícitos".

O magistrado explicou que não há permissão para violação do domicílio de usuários de drogas sem mandado judicial. O requisito para a "exceção constitucional à inviolabilidade domiciliar" é apenas a "situação de flagrante devidamente evidenciada".

Quanto à autorização formal da mãe, Linardi considerou que era inválida. "De acordo com as circunstâncias concretas, ela não detinha condições de compreender plenamente a ação policial."

A denúncia também alegou que a posse de drogas era um crime permanente, o que autorizaria o ingresso no domicílio, mas o juiz destacou que "os indícios de flagrante devem ser anteriores ao ingresso".

A defesa foi feita pelo advogado Diego Alves Moreira da Silva, sócio do escritório William Oliveira, Infante, Vidotto e Alves Advogados.

Clique AQUI para ler a decisão
Processo 1501821-09.2022.8.26.0320



Por José Higídio
Fonte: Conjur

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

STJ e o reconhecimento do tráfico privilegiado

Sem constatar adequada motivação para o afastamento do tráfico privilegiado — causa de diminuição de pena voltada àqueles que não se dedicam a atividade ilícita —, o ministro João Otávio de Noronha, do Superior Tribunal de Justiça, concedeu de ofício ordem de Habeas Corpus para reconhecer o direito de um condenado à minorante da sua pena. O magistrado determinou que o juízo de primeiro grau refaça a dosimetria da pena de acordo com tais premissas, bem como analise o regime inicial mais adequado à nova punição e a possibilidade de conversão da pena em restritiva de direitos. O homem foi condenado a sete anos e seis meses de prisão em regime fechado, além de 750 dias-multa, pela prática de tráfico de drogas. A pena-base foi aumentada levando-se em conta a quantidade de droga apreendida (157 quilos de maconha), o que levou à presunção de dedicação a atividades criminosas. O Tribunal de Justiça de São Paulo manteve a decisão, que transitou em julgado. O ministro relator lembr...

Lugar do crime: teoria da ubiquidade (CP) ou do resultado (CPP)?

Eudes Quintino de Oliveira Junior Muitas vezes, ao se analisar os dispositivos contidos em nossa legislação (sejam de direto material ou processual), verifica-se que há regras aparentemente distintas e contraditórias, o que fatalmente acarreta uma série de dúvidas aos operadores do Direito, sem falar ainda dos estudantes do bacharelado e dos concursos públicos. Com efeito, dispõe o artigo 6º, do CP, que: considera-se praticado o crime no momento da ação, ou da omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado. Já o artigo 70, do CPP, diz que a competência será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a infração, ou , no caso de tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato de execução. Pois bem, está caracterizada a aparente antinomia na área penal, em tema de lugar do crime. Os ventos são indicadores de furacão nos mares do sul. O CP diz que deve se considerar, como local onde praticada a infração penal, o lugar onde t...

Novo padrão probatório para testemunho policial em condenações criminais

Há tempos consolidou-se em nossos tribunais o entendimento pela validade dos depoimentos prestados por agentes estatais, havendo inclusive julgados afirmando que mereceriam maior crédito porque prestados por servidores, no exercício de suas funções. Entretanto, recentes decisões judiciais têm causado alteração no padrão de provas anteriormente exigido apontando no sentido de que as palavras dos policiais, como toda prova testemunhal, são passíveis de falhas, o que  recomenda (ou exige) a adoção, por parte do Estado, de cautelas maiores que a de simplesmente carrear à defesa o ônus de comprovar a parcialidade do agente ou de equívoco fático em seu testemunho. Não se pretende aqui colocar em xeque indistintamente a idoneidade dos agentes estatais, mas apenas apontar que a falibilidade de nossa memória e, portanto, da prova testemunhal em si, recomenda, como padrão probatório mínimo a fundamentar condenações criminais, a exigência de elementos outros, antes impossíveis devido ao "est...