Pular para o conteúdo principal

Sob vigilância constante de seguranças, acusada de furtar em loja é absolvida

Quando a vigilância de seguranças de loja sobre suspeitos é constante e eficaz a ponto de inviabilizar a consumação de um furto, o próprio delito sequer existe, ainda que na modalidade tentada, por ser impossível.

Essa foi a fundamentação adotada pela juíza Maria Priscilla Ernandes Veiga Oliveira, da 4ª Vara do Fórum Criminal da Barra Funda, na Zona Oeste de São Paulo, ao absolver uma mulher acusada de subtrair mercadorias avaliadas em cerca de R$ 1,2 mil.

"Não era possível a consumação do crime, vez que a acusada e o coagente foram vigiados desde o início da ação pelos funcionários do local. Em nenhum momento o patrimônio da empresa vítima correu real risco", destacou a magistrada.

A julgadora analisou a ação de dois seguranças ouvidos como testemunhas. Eles monitoraram a ré e um suposto comparsa, que fugiu correndo sem ser identificado, desde a chegada do casal ao estabelecimento até o momento da saída.

"O delito não se consumou por ineficácia absoluta do meio, na medida em que os funcionários suspeitaram da ré e do homem que com ela estava quando entraram na loja", concluiu a juíza.

Segundo a sentença, de 19 de janeiro, a absolvição teve por base o artigo 396, inciso III (não constituir o fato infração penal), do Código de Processo Penal, "reconhecendo a existência de crime impossível".

O Ministério Público requereu em suas alegações finais a condenação da ré por furto qualificado pelo concurso de agentes. O advogado Mário André Badures Gomes Martins pediu a absolvição por insuficiência de prova.

A acusada negou o crime em juízo e o advogado colocou em xeque as versões dos funcionários da loja. Ele também requereu que fossem juntadas nos autos as imagens de câmeras de segurança do estabelecimento.

"A filmagem mostraria que a minha a cliente não participou da tentativa de furto, mas o vídeo não foi anexado ao processo", justificou Badures. Subsidiariamente, caso a ré não fosse afastada da cena do delito, ele sustentou a tese do crime impossível.

Diz o artigo 17 do Código Penal que "não se pune a tentativa quando, por ineficácia absoluta do meio ou por absoluta impropriedade do objeto, é impossível consumar-se o crime". O crime impossível também é chamado de tentativa inidônea, tentativa inadequada ou quase crime.

Celeridade processual
A ação penal durou apenas três meses e meio, sendo que nesse período ainda houve o recesso forense. A ré foi presa em flagrante no dia 4 de outubro de 2022, sob a acusação de furtar na filial das Lojas Americanas situada no Shopping Market Place, na Zona Sul.

Conforme a denúncia, a acusada e o seu parceiro não identificado separaram duas bonecas, uma caixa de som, dois esmaltes de unha e dois pacotes de doces, saindo da loja sem pagá-los. Como a dupla era observada, os produtos foram recuperados em seguida.

A prisão em flagrante da ré foi convertida em preventiva. Ela respondeu a todo o processo no cárcere, sendo libertada após a absolvição. O alvará de soltura foi cumprido no Centro de Detenção Provisória Feminino de Franco da Rocha.

Processo 1522563-40.2022.8.26.0228


Por Eduardo Velozo Fuccia
Fonte: Conjur

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

STJ e o reconhecimento do tráfico privilegiado

Sem constatar adequada motivação para o afastamento do tráfico privilegiado — causa de diminuição de pena voltada àqueles que não se dedicam a atividade ilícita —, o ministro João Otávio de Noronha, do Superior Tribunal de Justiça, concedeu de ofício ordem de Habeas Corpus para reconhecer o direito de um condenado à minorante da sua pena. O magistrado determinou que o juízo de primeiro grau refaça a dosimetria da pena de acordo com tais premissas, bem como analise o regime inicial mais adequado à nova punição e a possibilidade de conversão da pena em restritiva de direitos. O homem foi condenado a sete anos e seis meses de prisão em regime fechado, além de 750 dias-multa, pela prática de tráfico de drogas. A pena-base foi aumentada levando-se em conta a quantidade de droga apreendida (157 quilos de maconha), o que levou à presunção de dedicação a atividades criminosas. O Tribunal de Justiça de São Paulo manteve a decisão, que transitou em julgado. O ministro relator lembr...

Lugar do crime: teoria da ubiquidade (CP) ou do resultado (CPP)?

Eudes Quintino de Oliveira Junior Muitas vezes, ao se analisar os dispositivos contidos em nossa legislação (sejam de direto material ou processual), verifica-se que há regras aparentemente distintas e contraditórias, o que fatalmente acarreta uma série de dúvidas aos operadores do Direito, sem falar ainda dos estudantes do bacharelado e dos concursos públicos. Com efeito, dispõe o artigo 6º, do CP, que: considera-se praticado o crime no momento da ação, ou da omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado. Já o artigo 70, do CPP, diz que a competência será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a infração, ou , no caso de tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato de execução. Pois bem, está caracterizada a aparente antinomia na área penal, em tema de lugar do crime. Os ventos são indicadores de furacão nos mares do sul. O CP diz que deve se considerar, como local onde praticada a infração penal, o lugar onde t...

Novo padrão probatório para testemunho policial em condenações criminais

Há tempos consolidou-se em nossos tribunais o entendimento pela validade dos depoimentos prestados por agentes estatais, havendo inclusive julgados afirmando que mereceriam maior crédito porque prestados por servidores, no exercício de suas funções. Entretanto, recentes decisões judiciais têm causado alteração no padrão de provas anteriormente exigido apontando no sentido de que as palavras dos policiais, como toda prova testemunhal, são passíveis de falhas, o que  recomenda (ou exige) a adoção, por parte do Estado, de cautelas maiores que a de simplesmente carrear à defesa o ônus de comprovar a parcialidade do agente ou de equívoco fático em seu testemunho. Não se pretende aqui colocar em xeque indistintamente a idoneidade dos agentes estatais, mas apenas apontar que a falibilidade de nossa memória e, portanto, da prova testemunhal em si, recomenda, como padrão probatório mínimo a fundamentar condenações criminais, a exigência de elementos outros, antes impossíveis devido ao "est...