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Presença brasileira na Corte Internacional de Justiça

Fato de singular relevância para o Brasil e para a América do Sul, a recente eleição do professor Leonardo Nemer Caldeira Brant, na ONU, para compor a Corte Internacional de Justiça, dá continuidade à histórica presença brasileira na instituição.

Dentre tantos fatores que compõem o patrimônio imaterial de um país, a contribuir para seu prestígio, destaca-se a forma com que ali se cultiva e respeita o direito internacional; como se dá seu estudo e seu exercício virtuoso, quesitos nos quais o Brasil possui larga tradição.

Dentre outros fatores de boas práticas do país, há que se destacar desde logo a marcante participação das forças armadas nos contingentes de paz das Nações Unidas, a par da formação  e da atuação de sua diplomacia, sem nunca deslembrar a copiosa presença política e jurídica em organizações e tribunais internacionais.

O direito internacional é peculiar: se formal, por um lado, como direito escrito baseado em tratados, por outro é informal, quando derivado de normas costumeiras e logo não escritas. Dessa sorte, disciplina sempre imperfeita e por fazer, nela tem-se espaço por excelência para o pensamento criativo e inovador, na dialética desconstrução/construção que permeia o progresso da humanidade. E nesse mister de prodígios tem sido vultosa a atuação de nossos conacionais, desde Ruy Barbosa, Clóvis Beviláqua e Epitácio Pessoa. Mas não apenas esses próceres tão citados nas escolas, tantos foram e que são os juristas brasileiros em destaque pelo mundo.

Bem a propósito, agora com sua eleição referendada pelo Conselho de Segurança, Caldeira Brant junta-se à expressiva galeria de nossos juízes na Haia do Vredespaleis, o sempre simbólico e cobiçado palácio da paz, desde Philadelpho Azevedo, já em 1946, passando por Levi Carneiro, em 1951, José Sette-Câmara, em 1979, Francisco Rezek, em 1997, e Antônio Augusto Cançado Trindade, em 2009.

Em outros fóruns internacionais, da mesma forma, atuaram expressivos representantes brasileiros, como no órgão de apelação da Organização Mundial do Comércio, em Genebra, e como no Tribunal do Direito do Mar, em Hamburgo, com os ofícios de professores eméritos das Arcadas, a Faculdade de Direito do Largo São Francisco, em São Paulo, respectivamente Luiz Olavo Baptista e Vicente Marota Rangel.

Caldeira Brant, que deverá completar o mandato de Cançado Trindade, falecido em maio deste ano, terá sua titularidade até 2027, podendo ser reconduzido para igual período. Com sede na capital política da Holanda, a Corte Internacional de Justiça é o principal órgão judiciário das Nações Unidas e é composta por 15 juízes eleitos para mandatos de nove anos.

Já no exercício pleno de seus poderes, em delicado momento no contencioso internacional, nosso novo representante  é professor da Universidade Federal de Minas Gerais, sua alma mater, a "vetusta casa de Afonso Penna", e doutor em direito pela Universidade de Paris. Conferencista e autor de prodigiosa doutrina, atuou como jurista adjunto na mesma Corte holandesa a que agora servirá a título pleno, durante o mandato de juiz Francisco Rezek. Organizador incansável de tradicional seminário de inverno em Belo Horizonte, onde reuniu expressivos professores de direito internacional não apenas brasileiros, a conceder-lhes a medalha do mérito de Ruy Barbosa, Caldeira Brant foi nesse sentido premônico acerca de sua própria biografia.

Afinal, Ruy foi pioneiro no engenho e arte brasileiros para o direito internacional, eleito já para o primeiro tribunal internacional, ainda sob a égide da Liga das Nações, criada pelo Tratado de Versalhes, em 1919, nos clamorosos anos do período entre guerras. Como no ápice da gloriosa carreira do ilustre baiano, o maior de nossos juristas, agora a honra incumbe a outro brasileiro, sempre uma missão e um destino.



Por Jorge Fontoura
Fonte: Conjur

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