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STJ anula apreensão de drogas feita depois de revista pessoal ilegal

Sem fundada suspeita, a revista pessoal é ilegal, bem como todas as provas que dela derivam. Com essa fundamentação, o ministro Reynaldo Soares da Fonseca, do Superior Tribunal de Justiça, concedeu de ofício habeas corpus para trancar a ação penal contra um homem acusado de tráfico de drogas. Abordado por policiais militares com 42 gramas de maconha e R$ 145 na frente de sua casa, o réu possuía no imóvel mais 66 quilos do entorpecente.

"Somente quando o contexto fático anterior à invasão permitir a conclusão acerca da ocorrência de crime no interior da residência é que se mostra possível sacrificar o direito à inviolabilidade do domicílio", justificou Fonseca. O ministro acrescentou que "a busca domiciliar decorreu diretamente de ilegal busca pessoal, não podendo ser validada aquela diligência nas condições em que realizada".

De acordo com os PMs, durante patrulhamento de rotina no dia 13 de julho de 2022, em Catanduva (SP), eles suspeitaram do acusado, porque o réu estava na calçada e virou as costas para a viatura "tentando disfarçar". Ele portava 42 gramas de maconha e dinheiro no bolso da bermuda, admitindo possuir mais drogas em casa, onde foram apreendidos 66 quilos da erva, duas balanças e material típico para embalar entorpecentes.

Ainda conforme os policiais, o réu os autorizou a revistarem o imóvel, o que foi negado pelo acusado na delegacia. Segundo o ministro, "importa salientar que o consentimento dado pelo paciente, durante abordagem policial na porta de sua residência — constando de seu interrogatório policial que não autorizou a entrada dos policiais militares em sua residência — em situação claramente desfavorável, não é suficiente para justificar a entrada no domicílio".

Autuado em flagrante e denunciado por tráfico, o acusado teve negado habeas corpus pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, motivando a sua defesa a tentar o trancamento da ação penal no STJ, sob a alegação da ilicitude das provas, devido à revista pessoal realizada sem justa causa. Em sua decisão, Reynaldo Soares da Fonseca pontuou que "nada foi dito acerca de eventual suspeita de que estivesse o paciente com entorpecentes".

Para o ministro, não existe nos autos "dado concreto que de forma efetiva justifique a existência de justa causa para a abordagem, o que contraria o artigo 240, parágrafo 2º, do Código de Processo Penal, ante a ausência de fundada suspeita". Desse modo, a ilegalidade verificada no nascedouro contaminou as demais provas, sendo hipótese de se aplicar a teoria dos frutos da árvore envenenada para anulá-las, trancar a ação penal e determinar a soltura do réu.

Fonseca não conheceu do habeas corpus por "ausência de regularidade formal, qual seja, a adequação da via eleita". O ministro observou que o recurso cabível contra acórdão do tribunal de origem que denega o HC é o ordinário. No entanto, conforme orientação do Supremo Tribunal Federal e jurisprudência do STJ, o julgador afirmou ser cabível conceder de ofício a ordem “quando a ilegalidade apontada é flagrante”.

HC 768.191



Por Eduardo Velozo Fuccia
Fonte: Conjur

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