Pular para o conteúdo principal

TSE: Compra de votos pode gerar absolvição cível e condenação criminal

A independência entre as instâncias cível e criminal é suficiente para permitir que a Justiça Eleitoral, com base nos mesmos fatos e provas, afaste a ocorrência do ilícito eleitoral de compra de votos, mas imponha pena criminal pela mesma conduta.

Com esse entendimento, o Tribunal Superior Eleitoral negou provimento ao recurso do ex-vereador de Nova Andradina (MS) João Dan (PSDB), que foi processado duas vezes por distribuir combustível a eleitores e apoiadores nas eleições de 2016.

Primeiro, ele foi alvo de ação de investigação judicial eleitoral por captação ilícita de sufrágio, ato descrito na Lei Complementar 64/1990. Porém, o Tribunal Regional Eleitoral de Mato Grosso do Sul entendeu que não havia indícios suficientes para configurar a compra de votos.

Depois, o mesmo TRE-MS condenou João Dan a três anos e quatro meses de prisão em regime inicial aberto pelo crime descrito no artigo 299 do Código Eleitoral: dar qualquer vantagem para obter voto. A corte entendeu, portanto, que havia provas para a condenação criminal pela compra de votos.

Ambas as condenações subiram ao TSE em recurso especial eleitoral. E nelas, a corte optou por manter as conclusões do TRE-MS porque rever a absolvição na Aije ou a condenação criminal implicaria revolver fatos e provas, medida vedada pela Súmula 24.

Ficou vencido o ministro Raul Araújo, que desafiou o princípio da independência das instâncias judiciais por entender como incongruente os mesmos fatos gerarem absolvição cível e condenação na seara penal, onde deve imperar o princípio in dubio pro reo (na dúvida, a favor do réu).

Mesmos fatos?
O julgamento do recurso contra a condenação criminal foi encerrado na sessão de terça-feira (28/3). A maioria se formou em torno do voto do relator, ministro Alexandre de Moraes, que manteve a punição com base em óbices eleitorais.

A divergência do ministro Raul Araújo se baseou no fato de o ilícito cível-eleitoral de captação ilícita de sufrágio e o ilícito criminal de compra de votos compartilharem a mesma elementar: é preciso o dolo específico de obter o voto do eleitor por meio da oferta de benefício.

"Como pode o tribunal regional, com esteio nos mesmos fatos e provas, entender no feito cível que não houve intenção de comprar votos e, no feito criminal, perfilar conclusão oposta, assentando que houve dolo especifico em corromper voto do eleitor?", indagou Araújo.

Em voto-vista, o ministro Ricardo Lewandowski afirmou que as decisões do TRE-MS não se basearam exatamente nos mesmos fatos, pois a Aije se ateve à distribuição de combustível em uma data específica de junho de 2016, enquanto a condenação criminal se baseou em mais de três meses da conduta.

A diferença na base de provas é o que justifica as conclusões diferentes, segundo ele. Formaram a maioria também os ministros Cármen Lúcia, Benedito Gonçalves, Sérgio Banhos e Carlos Horbach.

REspe 0000002-83.2018.6.12.0005


Por Danilo Vital
Fonte: Conjur

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Lugar do crime: teoria da ubiquidade (CP) ou do resultado (CPP)?

Eudes Quintino de Oliveira Junior Muitas vezes, ao se analisar os dispositivos contidos em nossa legislação (sejam de direto material ou processual), verifica-se que há regras aparentemente distintas e contraditórias, o que fatalmente acarreta uma série de dúvidas aos operadores do Direito, sem falar ainda dos estudantes do bacharelado e dos concursos públicos. Com efeito, dispõe o artigo 6º, do CP, que: considera-se praticado o crime no momento da ação, ou da omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado. Já o artigo 70, do CPP, diz que a competência será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a infração, ou , no caso de tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato de execução. Pois bem, está caracterizada a aparente antinomia na área penal, em tema de lugar do crime. Os ventos são indicadores de furacão nos mares do sul. O CP diz que deve se considerar, como local onde praticada a infração penal, o lugar onde t...

STJ e o reconhecimento do tráfico privilegiado

Sem constatar adequada motivação para o afastamento do tráfico privilegiado — causa de diminuição de pena voltada àqueles que não se dedicam a atividade ilícita —, o ministro João Otávio de Noronha, do Superior Tribunal de Justiça, concedeu de ofício ordem de Habeas Corpus para reconhecer o direito de um condenado à minorante da sua pena. O magistrado determinou que o juízo de primeiro grau refaça a dosimetria da pena de acordo com tais premissas, bem como analise o regime inicial mais adequado à nova punição e a possibilidade de conversão da pena em restritiva de direitos. O homem foi condenado a sete anos e seis meses de prisão em regime fechado, além de 750 dias-multa, pela prática de tráfico de drogas. A pena-base foi aumentada levando-se em conta a quantidade de droga apreendida (157 quilos de maconha), o que levou à presunção de dedicação a atividades criminosas. O Tribunal de Justiça de São Paulo manteve a decisão, que transitou em julgado. O ministro relator lembr...

STJ: Mera desconfiança da polícia não justifica invasão de domicílio

O ingresso da polícia militar em uma residência, sem mandado judicial e amparado em mera desconfiança dos agentes da polícia, torna imprestável a prova, uma vez que foi obtida em violação ao direito fundamental à inviolabilidade do domicílio. Com esse entendimento, o Superior Tribunal de Justiça concedeu habeas corpus a um réu preso em flagrante com 48g de crack, 485g de maconha e 213g de cocaína. Conforme consta nos autos, o suspeito foi abordado na rua por policiais em ronda e tentou fugir, mas foi pego jogando um pacote com drogas dentro de sua casa. Os agentes entraram na casa e apreenderam os entorpecentes e uma bicicleta roubada. O homem foi preso em flagrante, mas o ministro Antonio Saldanha Palheiro, relator do caso, entendeu que a obtenção de provas foi feita mediante invasão de domicílio. "As circunstâncias que antecederem a violação do domicílio devem evidenciar, de modo satisfatório e objetivo, as fundadas razões que justifiquem tal diligência e a eventual prisão em fl...