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Aposentadoria: Idade Mínima!

Idade mínima para aposentadoria ainda 
é tema controverso
Por Danieli da Silva Reis**

No presente trabalho suscintamente discorremos sobre o fator previdenciário, instituído em 1.999, através da Lei 9.876, que nada mais é do que a aplicação da idade mínima para aposentação. Trata-se de lei ordinária, aprovada por maioria simples, no intuito de alterar direitos e princípios constitucionais, modificando o cálculo da RMI dos segurados, nas hipóteses de aposentadoria por idade e por tempo de serviço, afetando principalmente o direito de igualdade entre os segurados. Entretanto, tendo-se decorrido mais de uma década da instituição do instituto, o tema ainda é bastante controvertido. 

A instituição do fator previdenciário, modificando o cálculo da renda mensal inicial, prejudicou principalmente os segurados da Previdência Social que se aposentaram entre 1.999 e 2004, causando-lhes diminuição no valor recebido a título de aposentadoria. 

Criado pela Lei 9.876/99, que deu nova redação ao art.29 da Lei 8.213/91, em seu § 7º, determinou a regra de cálculo do Fator Previdenciário, que consideraria a idade do segurado ao tempo da aposentadoria e sua expectativa de sobrevida. Ressalte-se ainda que a expectativa de vida, conforme disposto no § 8º, deriva de Tabela de Mortalidade expedida pelo IBGE, onde sobretudo os homens, por terem expectativa de vida menor, foram prejudicados por terem sido submetidos ao cálculo de sobrevida da mulher, que é maior. 

Não páira dúvida de que há gritante ofensa ao Princípio da Isonomia, já que pessoas que contribuíram durante o mesmo período, sobre o mesmo salário de contribuição, mas com idades diferentes ao tempo do requerimento, receberão uma RMI diferente, onde a mais velha obterá uma Renda Mensal Inicial maior, e consequentemente um valor superior na sua aposentadoria, ocasionado um tratamento desigual entre os segurados. 

A aplicação do FP também afronta o Princípio da Reciprocidade das Contribuições, ao interferir no valor da RMI para pessoas que contribuíram com o mesmo valor, sobre o mesmo período de tempo, onde o valor recolhido não guardará relação com o montante do benefício. 

Esse instituto vem causando, sobretudo, insegurança jurídica, já que o segurado não pode planejar sua vida futura, pois independente do período e do valor que vier a Recolher para os Cofres Públicos da Previdência, haverá redução do que será recebido, de acordo com sua idade no momento do Cálculo da RMI. 

Essa questão tem suscitado muitas controvérsias no cenário social e jurídico, pelo fato de uma lei infraconstitucional (lei ordinária) ter alterado as regras de aposentação. Temos que certas normas só podem ser modificadas no próprio corpo da Constituição Federal, ou em leis infraconstitucionais, quando tal possibilidade for expressamente prevista na Lei Maior. 

Ademais, pelo próprio espírito de nosso Ordenamento Jurídico, uma lei infraconstitucional não pode, em seu teor e finalidade, contrariar os Princípios Constitucionais, o que ocorre de forma latente no indigitado instituto, principalmente no que se refere aos Princípios da Isonomia e da Reciprocidade de Contribuições. 

Tendo em vista que essa lei ainda não foi declarada inconstitucional pelo STF, o beneficiário pode se socorrer da discussão pela via difusa, no intuito de ver declarada a inconstitucionalidade e/ou inaplicabilidade do FP para seu caso concreto. 

Algumas são as teses que podem ser discutidas judicialmente, como a violação ao art. 201, CF/88, que estabelece as condições para a aposentadoria, sendo que aposentadoria por idade e por tempo de contribuição são institutos distintos que não se misturam. Já a lei que criou o FP criou uma modalidade híbrida de aposentadoria, que leva em conta o tempo de contribuição, a idade ao tempo do cálculo da RMI, mais o tempo (especulativo) de sobrevida do indivíduo. 

Vislumbra-se também o desrespeito ao Art. 5º da CF, bojo pétreo da Lei Maior, já que nele está prevista a maioria dos direitos fundamentais da pessoa humana, vetor básico da Democracia, como o Direito a Igualdade. 

Verifica-se que esse instituto, ao ser aplicado, viola o art. 7º, XXX, CF, que veda a disparidade entre salários, na hipótese de discriminação por idade, sexo, cor ou estado civil, procurando-se resguardar novamente a igualdade entre as pessoas. Esse Princípio é de tão elevada importância, que além de vir expresso no Art. 5º, vem implícito em muitos outros artigos e Princípios, como forma de resguardar a isonomia e o respeito ao Estado Democrático de Direito, que vela pela não supressão de Direitos. 

Mesmo que esse instituto esteja eivado de irregularidades, enquanto não houver a declaração de sua inaplicabilidade, mesmo que pela via difusa, o INSS, na condição de agente público, e devendo observar o princípio da legalidade estrita, ou seja, estando vinculado ao que a Lei determina, não pode deixar de aplicar o Fator Previdenciário. 

Além da inconstitucionalidade do instituto, criado por lei infraconstitucional, que vem a contrariar dispositivos e Princípios constitucionais que já foram acima elucidados, há outras teses que podem ser discutidas judicialmente, no escopo de ser declarada a inaplicabilidade desse fator no cálculo da RMI, e assim lograr o direito de tê-la calculada no montante a que efetivamente teria direito, recebendo acréscimos em percentuais que variam caso a caso. 

No caso de beneficiários do sexo masculino, pode-se pedir a revisão tendo em vista que a tabela para cálculo de mortalidade é unica, e calculada em relação a sobrevida da mulher, que é mais alta que a do homem, podendo-se alcançar um reajuste de até 8%. 

Na hipótese de pessoas que alcançaram a idade para se aposentar, cumprindo o prazo de tempo de contribuição, o fator não poderia ser aplicado, sendo que nessas hipóteses, o reajuste pode alcançar até 80% 

Em casos de aposentadoria por tempo especial, tendo-se cumprido o tempo de contribuição estipulado para cada caso, o reajuste pode variar entre 15% a 80%. 

Questão muito importante recai sobre o direito de pensionistas que também sofreram reduções em seus benefícios pela aplicabilidade do Fator Previdenciário. Aqui, temos três situações distintas: 

a. Se a pensão decorrer da morte de pessoa já aposentada, e esta teve o FP aplicado sobre o cálculo de sua RMI, e não recorreu em vida, o direito torna-se extensivo ao pensionista, que pode requerer a revisão do seu benefício, recebendo a diferença dos valores já pagos, nos últimos 5 anos, assim como terá um aumento no valor de sua pensão; 
b. Na hipótese anterior, se quem entrar com ação judicial for o inventariante ou espólio, receberá os valores atrasados dos últimos 05 anos; 
c. Outra questão importante é a seguinte - falece um contribuinte da previdência, que ainda não era aposentado: Observados os moldes legais que determinam a forma em que se dará o cálculo da sua renda mensal inicial da pensão por morte, deve ser observado o art. 75 da Lei 8.213/91 (alterada pelas Leis nº 9.876/99, 9.032/95 e 11.718/2008), que dispõe que o valor da aposentadoria por morte corresponderá à 100% do a que teria direito o segurado, se na data do falecimento estivesse aposentado por invalidez. Já o art. 44 da mesma Lei assegura que o valor do benefício deverá ser de 100% sobre a renda mensal que o trabalhador auferia sob a forma de salário. 

Neste sentido, temos: 

“A pensão por morte corresponderá a totalidade dos vencimentos ou proventos do servidor falecido, sendo que este "quantum" deverá corresponder ao valor da respectiva remuneração ou provento, observado o teto inscrito no art 37, XI, da Constituição Federal. Recurso extraordinário conhecido e provido’ "(R.E. n° 198 270-5- São Paulo). 

“Estabelecendo o § 5o do artigo 40 que a pensão corresponderá à totalidade dos vencimentos ou proventos do servidor falecido, segue-se a impossibilidade de uma lei ordinária dispor a respeito de um limite que esteja abaixo da totalidade referida.” (Mandado de Injunção n° 257-6, Relator Ministro Moreira Alves, julgado de 10.11 93, DJU de Io 7 94, pag 17 494) 

O fator previdenciário criou um instituto híbrido e discriminador, ou seja, quanto mais jovem for o segurado, menor será sua renda mensal inicial, mesmo que tenha contribuído por período equivalente e mediante os mesmos valores de outro segurado, de idade mais avançada. 

Na prática, não há isonomia e reciprocidade de valores mesmo que os segurados se encontrem nas mesmas condições, isto é, tenham o mesmo tempo de serviço, mesmo tempo de contribuição, igual base de cálculo, pois a idade de cada um interferirá no cálculo de sua RMI. 

Ao instituir a aplicação do fator previdenciário no cálculo do RMI dos segurados, a Lei 9.876/99, ofendeu ostensivamente o art. 201, § 1º, que veda a prática de discriminação de segurados nas mesmas condições, no auferimento do valor do benefício, em decorrência de idade, sexo, cor, etc. 

Essa situação tem gerado incerteza jurídica, já que os beneficiários não podem planejar sua vida futura considerando o valor que contribuem mensalmente, visto que não há qualquer correspondência entre esse valor, o tempo de contribuição e o efetivo valor que auferirá a título de benefício. 

O que o segurado deve fazer é procurar o Judiciário para que seja declarada a inconstitucionalidade do FP, tendo em vista que foi criado por Lei Infraconstitucional, que claramente afronta o art. 201, § 1º, art. 5º e art. 7, XXX CF, e indiretamente outros princípios norteadores do Estado Democrático de Direito, já que enquanto não afastado judicialmente, o INSS, em decorrência da observância da legalidade estrita, não pode deixar de aplicá-lo aos benefícios. 

Bibliografia

BRASIL. Vade Mecum Acadêmico de Direito. Org. Anne Joyce Angher. 12ª Ed.São Paulo: Rideel,2011 

CASTRO, Carlos Alberto P.; LAZZARI João Batista. Manual de Direito Previdenciário. 14ª Ed. Santa Catarina: Conceito Editorial, 2012. 

FERREIRA, Vandeler. INSS- Revisão de Aposentadoria e Fator Previdenciário. Disponível em: http://vandelerferreira.blogspot.com.br. Acesso em 27/05/2012. 

GOUVEIA, Carlos AlbertoVieira de.; MARQUES, Samantha da Cunha. Da Natureza Inconstitucional do Fator Previdenciário. Disponível em: http://www.ambito-juridico.com.br. Acesso em 28/05/2012. Martins, Sergio Pinto. Direito da Seguridade Social. 32. ed. São Paulo. Atlas. 2012. 

** Danieli da Silva Reis é advogada, especialista em Direito do Estado e integrante da Comissão de Direito Ambiental da OAB-SP.

Fonte: Conjur

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