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Ministro do STJ anula condenação baseada em reconhecimento que não seguiu CPP

Os procedimentos estabelecidos no Código de Processo Penal para o reconhecimento de pessoas são obrigatórios, e não meras recomendações. Assim, devem ser seguidos de forma a assegurar o direito de defesa dos acusados.

Com esse entendimento, o ministro do Superior Tribunal de Justiça Antonio Saldanha Palheiro declarou a ilegalidade do reconhecimento pessoal de um acusado de roubo com arma de fogo. Dessa maneira, o magistrado anulou a sentença que condenou o réu a seis anos e oito meses de reclusão.

Em Habeas Corpus, o defensor público do Rio de Janeiro Eduardo Newton destacou que, no reconhecimento fotográfico, a polícia não apresentou fotos de outras pessoas à vítima, apenas as do acusado. No Judiciário, disse Newton, "o reconhecimento pessoal não foi precedido de descrição física da pessoa a ser reconhecida, sendo certo que a prova maior do que se alega é aferida na ausência de qualquer indicação no termo de reconhecimento".

"Além disso, não é crível que em um ambiente, o fórum central, com 30 serventias judiciais com competência para matéria criminal (quatro Tribunais do Júri, auditoria de Justiça Militar, 25 varas criminais), somente uma outra pessoa pudesse ter características físicas parecidas com o paciente", ressaltou o defensor.

Em sua decisão, Antonio Saldanha Palheiro citou que a 6ª Turma do STJ firmou o entendimento de que os procedimentos descritos no artigo 226 do CPP para o reconhecimento de pessoas não são simples recomendações do legislador, devendo necessariamente ser cumpridos, pois configuram a garantia do direito de defesa para quem é suspeito da prática de um crime (HC 598.886).

"Com tal entendimento, objetiva-se a mitigação de erros judiciários gravíssimos que, provavelmente, resultaram em diversas condenações lastreadas em acervo probatório frágil, como o mero reconhecimento fotográfico de pessoas em procedimentos crivados de vícios legais e até psicológicos — dado o enviesamento cognitivo causado pela apresentação irregular de fotografias escolhidas pelas forças policiais —, que acabam por contaminar a memória das vítimas, circunstância que reverbera até a fase judicial e torna inviável posterior convalidação em razão do viés de confirmação", declarou o magistrado.

A análise do processo, destacou o ministro, demonstra que a Justiça do Rio considerou as regras previstas no artigo 226 do CPP como meras recomendações. Dessa forma, declarou Saldanha, o Judiciário limitou-se a justificar a condenação com base no reconhecimento pessoal ilegal, sem apontar outras provas capazes de comprovar a autoria do crime.

Clique AQUI para ler a decisão
HC 768.881



Por Sérgio Rodas
Fonte: Conjur

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