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Obrigação Pública: Morador de área irregular deve ter água potável

Por Jomar Martins

O fato de o morador ocupar imóvel em área verde, de forma irregular, não justifica a recusa da municipalidade em instalar a rede de água. Além de elemento essencial à vida, trata-se de atender a saúde pública. Com este entendimento, a 22ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul manteve a sentença que obrigou o Município de Santa Rosa a providenciar a ligação de água potável a uma munícipe, que reside numa área de preservação permanente.

O julgamento ocorreu no dia 31 de março, com a presença dos desembargadores Mara Larsen Chechi, Carlos Eduardo Zietlow Duro e Maria Isabel de Azevedo Souza (presidente e relatora). Cabe recurso.

Após completar 10 anos ocupando imóvel numa área verde pertencente ao Município de Santa Rosa e cansada de esperar pela ligação da água, a moradora ingressou em juízo contra o Poder Público municipal e contra a Companhia Rio-Grandense de Saneamento (Corsan), no dia 12 de junho de 2009.

Alegou que a área já é bastante urbanizada, sendo, inclusive, plenamente abastecida com energia elétrica e água potável, menos o imóvel em que reside. Disse que era obrigada a captar a água de uma vizinha, reembolsando metade do custo, mensalmente.

Em primeira instância, a juíza Miroslava do Carmo Mendonça extinguiu o processo contra a Corsan, sem decidir o mérito, por entender que a instituição não era parte legítima para responder o processo.

Já o Município de Santa Rosa contestou. Argumentou, preliminarmente, a impossibilidade jurídica do pedido – expressa vedação legal de ocupação de área verde, nos termos do artigo 8º da Lei Complementar Municipal nº 33/2006. No mérito, alegou que incumbia à autora, por ocasião da aquisição do bem, verificar sua regularidade perante a Administração Pública.

Seguindo os passos do Ministério Público, a juíza entendeu por procedente o pedido da moradora. Assim, ela condenou o Município a fornecer um sistema de água potável para o uso doméstico, ‘‘instalando o que for necessário para a efetivação da medida”. Inconformada, a municipalidade apelou ao Tribunal de Justiça.

A relatora do recurso e presidente do colegiado, desembargadora Maria Isabel de Azevedo Souza, disse que o fato de o imóvel se encontrar em área verde não justifica o desatendimento por parte da Prefeitura. ‘‘Isso porque, em se tratando de ocupação irregular tolerada pelo Poder Público, cumpre adotar as medidas necessárias para a instalação da rede de água. Não pode ser negado o abastecimento, já que, a par da essencialidade da água, trata-se de atender à saúde pública. Cabia-lhe, isto sim, adotar as providências que entendesse cabíveis para fazer cessar a ocupação irregular’’, complementou.

A relatora também adotou, como razões de decidir, o parecer do procurador de Justiça Júlio Cesar Finger, para quem ‘‘o fornecimento de água no local é medida necessária, até mesmo para que se dê regularmente a proteção ao meio ambiente, observadas as diretrizes estabelecidas pelo ente público. O fato de a ocupação ser indevida/irregular deve ser apontado por meio de adoção de medidas administrativas e/ou judiciais próprias, que passam ao largo dos limites estabelecidos nessa lide”.

Ela lembrou decisão monocrática proferida na análise de uma apelação cível, julgada pela 22ª Câmara Civil em 23 de outubro de 2009, cuja ementa diz: ‘‘Enquanto perdurar a ocupação de área pública para fim de moradia, ainda que irregular, cumpre abastecer o imóvel de rede de água.’’ Seu voto foi seguido à unanimidade pelos demais desembargadores.

Clique aqui para ler a íntegra do acórdão.

Fonte: Conjur

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