Pular para o conteúdo principal

Lei Mariana Ferrer não impede juntada de antecedentes de vítima no júri

Não se pode negar a juntada aos autos de certificado e folha de antecedentes criminais da vítima no Tribunal do Júri, já que a integridade do direito de defesa tem como um dos seus pontos centrais a plenitude retórica, sendo possível aos jurados absolver um réu por fatores extraprocessuais. 

 Esse foi o fundamento adotado pela 7ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Minas Gerais para dar provimento a Habeas Corpus em favor de dois acusados de homicídio e anular decisão que negou a juntada aos autos de documentos com os antecedentes criminais da vítima. 

Ao analisar o pedido, o relator, desembargador Marcílio Eustáquio Santos, deu razão aos argumentos da defesa de que a negativa de juntada dos antecedentes da vítima viola os princípios constitucionais da plenitude de defesa, do contraditório e do devido processo legal.

O desembargador explicou que a Lei 14.245, de 22 de novembro de 2021, conhecida como Lei Mariana Ferrer, não pode impedir o pedido defensivo. A norma determina que, durante as fases de instrução e julgamento, fica vedada a manifestação sobre circunstâncias relativas à vítima alheias aos fatos em julgamento. 

O julgador, contudo, defendeu que o propósito da lei é evitar que as partes atuantes no processo aumentem o sofrimento da vítima, a expondo a situações humilhantes ou vexatórias.

"No caso dos autos, a juntada da CAC/FAC (Certidão de Antecedentes Criminais/ Folha de Antecedentes Criminais) da vítima não ocasionará sua revitimização: primeiro, porque os documentos são públicos e possuem natureza objetiva (desprovidos de juízos de valor); e segundo, porque a própria denúncia acostada ao feito já narra o seu histórico criminal, não se tratando, portanto, de algo novo que ocasionará reflexos em sua honra objetiva e na forma como era vista na sociedade."

O desembargador também sustentou que a apresentação de documentos policiais sobre a vítima tem relação com o caso concreto, e não tem como objetivo apenas expor, sem fundamento, sua vida pregressa. Diante disso, ele entendeu que ficou demonstrada a violação da plenitude de defesa e ordenou a juntada dos documentos aos autos. O entendimento foi seguido por unanimidade. 

Os réus são representados pelo advogado Ércio Quaresma Firpe

Clique AQUI para ler a decisão
Processo 1.0000.23.088938-8/000


Por Rafa Santos
Fonte: Conjur

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Lugar do crime: teoria da ubiquidade (CP) ou do resultado (CPP)?

Eudes Quintino de Oliveira Junior Muitas vezes, ao se analisar os dispositivos contidos em nossa legislação (sejam de direto material ou processual), verifica-se que há regras aparentemente distintas e contraditórias, o que fatalmente acarreta uma série de dúvidas aos operadores do Direito, sem falar ainda dos estudantes do bacharelado e dos concursos públicos. Com efeito, dispõe o artigo 6º, do CP, que: considera-se praticado o crime no momento da ação, ou da omissão, no todo ou em parte, bem como onde se produziu ou deveria produzir-se o resultado. Já o artigo 70, do CPP, diz que a competência será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a infração, ou , no caso de tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato de execução. Pois bem, está caracterizada a aparente antinomia na área penal, em tema de lugar do crime. Os ventos são indicadores de furacão nos mares do sul. O CP diz que deve se considerar, como local onde praticada a infração penal, o lugar onde t...

STJ e o reconhecimento do tráfico privilegiado

Sem constatar adequada motivação para o afastamento do tráfico privilegiado — causa de diminuição de pena voltada àqueles que não se dedicam a atividade ilícita —, o ministro João Otávio de Noronha, do Superior Tribunal de Justiça, concedeu de ofício ordem de Habeas Corpus para reconhecer o direito de um condenado à minorante da sua pena. O magistrado determinou que o juízo de primeiro grau refaça a dosimetria da pena de acordo com tais premissas, bem como analise o regime inicial mais adequado à nova punição e a possibilidade de conversão da pena em restritiva de direitos. O homem foi condenado a sete anos e seis meses de prisão em regime fechado, além de 750 dias-multa, pela prática de tráfico de drogas. A pena-base foi aumentada levando-se em conta a quantidade de droga apreendida (157 quilos de maconha), o que levou à presunção de dedicação a atividades criminosas. O Tribunal de Justiça de São Paulo manteve a decisão, que transitou em julgado. O ministro relator lembr...

STJ: Mera desconfiança da polícia não justifica invasão de domicílio

O ingresso da polícia militar em uma residência, sem mandado judicial e amparado em mera desconfiança dos agentes da polícia, torna imprestável a prova, uma vez que foi obtida em violação ao direito fundamental à inviolabilidade do domicílio. Com esse entendimento, o Superior Tribunal de Justiça concedeu habeas corpus a um réu preso em flagrante com 48g de crack, 485g de maconha e 213g de cocaína. Conforme consta nos autos, o suspeito foi abordado na rua por policiais em ronda e tentou fugir, mas foi pego jogando um pacote com drogas dentro de sua casa. Os agentes entraram na casa e apreenderam os entorpecentes e uma bicicleta roubada. O homem foi preso em flagrante, mas o ministro Antonio Saldanha Palheiro, relator do caso, entendeu que a obtenção de provas foi feita mediante invasão de domicílio. "As circunstâncias que antecederem a violação do domicílio devem evidenciar, de modo satisfatório e objetivo, as fundadas razões que justifiquem tal diligência e a eventual prisão em fl...