Nos crimes contra a liberdade sexual, como o estupro, é dada à palavra da vítima maior peso, uma vez que tais delitos costumam ser cometidos na clandestinidade, longe dos olhares de terceiros. Porém, a força para acusar conferida a quem sofre a violência exige que a versão apresentada seja coerente com o contexto probatório, sob pena de ser canalizada em benefício do acusado.
Esse entendimento, que remeteria o leigo ao ditado "pau que bate em Chico, bate em Francisco", foi adotado pela 8ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJ-MG). Por unanimidade, o colegiado negou provimento a recurso em sentido estrito interposto pelo Ministério Público (MP) contra a decisão da 2ª Vara Criminal de Araguari que indeferiu pedido de prisão preventiva de um acusado de estupro.
O órgão acusador sustentou em seu recurso que as condições pessoais do recorrido são desfavoráveis à concessão da liberdade provisória, "sobretudo pela conduta delituosa e pela habitualidade criminosa perpetrada pelo agente em delitos de mesma natureza".
Conforme o desembargador Henrique Abi-Ackel Torres, relator do recurso, o juízo de primeiro grau apontou em sua decisão que as declarações prestadas pela vítima não são coesas e coerentes com todo o contexto fático demonstrado pelos elementos probatórios constantes nos autos — em especial com o depoimento de uma testemunha, que afirmou ter presenciado o estupro.
Por essa razão, segundo o relator, tanto a materialidade quanto os indícios de autoria necessitam de melhor elucidação, não sendo cabível nesse cenário a decretação da custódia cautelar. Quanto às circunstâncias específicas do delito sob exame, Torres frisou que elas não extrapolam a gravidade inerente ao tipo penal a ponto de justificarem, por si só, a prisão preventiva para garantir a ordem pública.
Ainda que estivessem presentes prova da materialidade e indícios suficientes de autoria, conforme o relator, "inexistem elementos suficientes para caracterizar a gravidade concreta do delito, além daquela própria do tipo penal, tampouco elevada potencialidade lesiva da conduta ou periculosidade do agente".
Os desembargadores Márcia Milanez e Dirceu Walace Baroni seguiram o relator.
O colegiado citou o parecer da Procuradoria-Geral de Justiça pelo improvimento do recurso, devido à ausência dos requisitos da imprescindibilidade e da contemporaneidade da preventiva para o caso concreto. O órgão ainda apontou a falta de registros policiais e judiciais no sistema do TJ-MG do envolvimento do acusado em outras infrações penais.
Por Eduardo Velozo Fuccia
Fonte: Conjur
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