O procurador-geral da República, Augusto Aras, acionou o Supremo Tribunal Federal nesta terça-feira (27/12) contra trechos do indulto de Natal do presidente Jair Bolsonaro (PL) que perdoa agentes de segurança pública.
Com o indulto, foram perdoados policiais condenados, ainda que de forma provisória, por crimes cometidos há mais de 30 anos e que não eram considerados hediondos à época. A medida favorece, por exemplo, os policiais envolvidos no massacre do Carandiru, que ocorreu em outubro de 1992.
Segundo Aras, o indulto não deve alcançar "os crimes hediondos definidos em lei na data da edição do decreto presidencial", sendo "irrelevante a ausência dessa qualificação legal (de crime hediondo) na data da prática do fato delituoso pelo qual o agente estatal foi condenado".
"O indulto natalino conferido pelo Presidente da República aos agentes estatais envolvidos no caso do Massacre do Carandiru representa reiteração do Estado brasileiro no descumprimento da obrigação assumida internacionalmente de processar e punir, de forma séria e eficaz, os responsáveis pelos crimes de lesa-humanidade cometidos na Casa de Detenção em 02.10.1992", disse o PGR.
De acordo com Aras, a Constituição Federal proíbe o indulto para crimes hediondos. Também afirma que a Carta Magna barra o perdão a crimes de lesa-humanidade ao determinar a observância a tratados internacionais de direitos humanos.
Além de suspender trechos do decreto, Aras pediu que o STF colha informações de Bolsonaro e da Advocacia-Geral da União e, em seguida, abra prazo para manifestação da PGR.
O crime de homicídio só passou a ser enquadrado como hediondo em 1994, após forte mobilização popular pelo assassinato da atriz Daniella Perez. Em 1992, quando houve o massacre do Carandiru, apenas estupro, latrocínio e extorsão mediante sequestro eram considerados crimes hediondos no Brasil.
O indulto, portanto, abrange os policiais militares envolvidos no massacre do Carandiru, que completou 30 anos em outubro de 2022. Na ocasião, tropas da PM comandadas pelo coronel Ubiratan Guimarães assassinaram 111 presos. O episódio foi parcialmente televisionado e teve destaque internacional. O decreto presidencial foi criticado por especialistas consultados pela ConJur.
É impossível, ainda hoje, afastar o impacto do massacre do Carandiru na sociedade brasileira. O episódio está ligado à fundação do Primeiro Comando da Capital, facção que surgiu nas penitenciárias paulistas para combater a opressão dentro do sistema criminal e, hoje, é uma das maiores organizações criminais do mundo.
A chacina foi retratada em livros, músicas e também no cinema. O filme Carandiru, de Hector Babenco, foi um enorme sucesso, multipremiado e que chegou a ser listado para concorrer a uma vaga ao Oscar.
Inspirado no livro Estação Carandiru, de Dráuzio Varella, o filme foi lançado em 2003 e não agradou ao Coronel Ubiratan, que classificou-o de injusto, irresponsável e covarde. “Pergunto: se um dos jurados vir essas cenas e amanhã vier a julgar um daqueles homens que estavam comigo, ele já virá pré-concebido por ver a ação da Polícia Militar como violenta", disse, à época. Ubiratan morreu em 2006.
A canção Diário de um detento, do grupo de rap Racionais MC's, retrata o massacre pela ótica de um preso. A música ficou em 52º lugar no ranking das 100 maiores canções brasileiras feito pela revista Rolling Stone.
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Por Tiago Angelo
Fonte: Conjur
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