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Impactos das interceptações telemáticas na persecução penal internacional


Está previsto para esta quinta-feira (12/5) o julgamento no STF da tão aguardada Ação Direta de Constitucionalidade nº 51, que fora ajuizada pela Federação das Associações da Empresas de Tecnologia da Informação (Assespro Nacional), em 2017.

O escopo é a constitucionalidade do “acordo de assistência judiciária em matéria penal" (em inglês, Mutual Legal Assistance Treaty — MLAT), fruto de um decreto federal, que norteia as investigações criminais brasileiras que envolvam alvos nos Estados Unidos.

Especificamente, tal pacto pontua temas altamente sensíveis no âmbito da "persecução penal internacional": a obtenção de dados e a interceptação telemática de informações privadas controladas por provedores de aplicativos de internet sediados no exterior, como por exemplo Google, Facebook e Yahoo, cujos funcionários estão sujeitos à jurisdição norte-americana.

Na prática, o STF vai decidir se todo esse acesso requisitado pelas autoridades brasileiras deve obedecer à cooperação jurídica internacional ou às leis do Brasil (mesmo que se chocando com a legislação natal das empresas internacionais em detrimento da soberania brasileira).

Notadamente, cabe sopesar que, conforme entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, as empresas estrangeiras provedoras de internet e e-mail — mesmo não havendo leis que as vinculem a manter os dados das contas sob sua tutela em solo brasileiro —, vêm sendo impelidas por força judicial a fornecerem as informações por meio das suas subsidiárias instaladas no Brasil.

Todavia, tanto nos Estados Unidos como na Europa, existem vedações legais quanto à cessão desse "ativo" sigiloso sobre comunicações privadas a entes estrangeiros (como o Brasil, por exemplo); a menos que haja colaboração recíproca reconhecida entre os países. Logo, o motivo da relevância do iminente julgamento, cuja relatoria é do ministro Gilmar Mendes.

Outrossim, sublinha-se que a Procuradoria Geral da República se manifestou pelo não conhecimento da ação pois, segundo parte do parecer da PGR, “as normas objeto da ação declaratória não consolidam os únicos meios possíveis de obtenção de dados telemáticos por autoridades brasileiras, de maneira que a declaração de sua constitucionalidade não resulta na obrigatoriedade de adoção dos instrumentos nelas previstos".

Ademais, a PGR enfatizou que "o artigo 11 da Lei 12.965/2014 (Marco Civil da Internet) autoriza que as autoridades brasileiras requisitem diretamente a empresas estrangeiras que prestam serviços ou tenham filial no Brasil, dados de comunicação telemática decorrentes da utilização de aplicações de provedores de internet cuja sede de controle de dados não esteja localizada em território brasileiro".

Não obstante, ainda finalizou apontando que "qualquer restrição à capacidade das autoridades brasileiras de obterem diretamente dados e comunicações de brasileiros, coletados por empresas aqui constituídas ou que aqui prestam serviços direcionados a brasileiros, gerará imenso prejuízo a investigações em andamento e ações penais já transitadas em julgado, tornando praticamente impossível a correta e eficiente apuração de crimes praticados através da rede mundial de computadores".

Assim, ante à análise desse turbulento cenário de troca de provas inserido na "persecução penal internacional", estima-se que o STF deva decidir que a quebra de sigilo telemático — e o conseguinte fornecimento às autoridades judiciais brasileiras —, obedeça aos ditames da cooperação bilateral internacional.

Com isso, uma vez confirmada essa previsão, não restarão dúvidas quanto à vitória da justiça, mormente à solidez jurídica que será instalada no arcabouço persecutório penal brasileiro e, ainda, nas próprias relações diplomáticas.

Referências:


Fonte: ConJur

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