Estudo inédito sobre o funcionamento dos serviços de alternativas penais durante a crise de Covid-19 a partir de recomendações do Conselho Nacional de Justiça identificou situações como a falta de estrutura e de pessoal, assim como de padronização sobre o cumprimento das medidas.
O estudo analisou a situação de Centrais Integradas de Alternativas Penais em 18 capitais, a partir do retorno a questionários enviados a tribunais de 27 unidades da federação.
Ao levantar informações sobre características locais, estrutura física e de pessoal, atividades das centrais e dos Juízos durante a pandemia, fluxo de casos e perfil dos atendidos, também foram identificadas situações de baixo acompanhamento de medidas e de sistematização de dados sobre o perfil dos atendidos.
O estudo foi realizado com o apoio do programa Fazendo Justiça, parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento e apoio do Ministério da Justiça e Segurança Pública para incidir em desafios na privação de liberdade fomentando alternativas ao encarceramento.
De maneira geral, a maioria das Centrais considerou as recomendações emitidas pelo CNJ no período, porém há desafios a serem superados para a retomada e fortalecimento dos serviços no contexto pós-pandemia. “[As medidas sanitárias] evidenciaram a necessidade de suporte assistencial aos atendidos e às suas famílias paralelamente ao acompanhamento das medidas, dado que a vulnerabilidade desses grupos é alta e tornou-se maior durante a pandemia”, aponta trecho do estudo.
Para o juiz coordenador do Departamento de Monitoramento e Fiscalização do Sistema Carcerário e do Sistema de Execução de Medidas Socioeducativas do CNJ (DMF/CNJ), Luís Lanfredi, o estudo permite identificar os pontos que podem ser trabalhados para o fortalecimento das alternativas penais no país a partir da experiência com a pandemia de Covid-19.
“Os avanços legais e normativos projetam as alternativas penais como resposta a problemas persistentes no campo prisional, mas avanços de longo prazo demandam mobilização em diferentes frentes estratégicas, além de a criação de estrutura, física e de recursos humanos, para reforçar o leque de responsabilizações diversas do para além do encarceramento”, afirma o coordenador do DMF.
De acordo com a juíza auxiliar da Presidência do CNJ com atuação no DMF, Karen Luise Vilanova Batista de Souza Pinheiro, o CNJ trabalha para concretização da política institucional do Poder Judiciário para a promoção da aplicação de alternativas penais com enfoque restaurativo em substituição à privação de liberdade, detalhado na Resolução CNJ 288/2019.
O CNJ tem ainda grupo de trabalho instituído para alavancar possibilidades de incidência que avancem na redução do encarceramento. “Apesar dos avanços significativos na política de alternativas penais nas últimas décadas, os dados mostram não haver variações significativas nestes índices ao longo dos anos”, explica. Ainda neste ano, o CNJ realiza a quarta edição do Fórum Nacional de Alternativas Penais.
Também foi identificada dificuldade na interiorização do cumprimento das alternativas penais. No Amazonas, Piauí e em Roraima, as centrais atendem apenas a capital, sem abrangência para outros municípios.
Outro ponto levantado pelo estudo está na falta de financiamento permanente para as centrais. A principal fonte dos recursos são convênios com o Governo Federal. Das unidades analisadas, dez tinham financiamento que se encerrariam entre dezembro de 2021 e julho de 2022. Esse dado reforça a necessidade assegurar autonomia financeira das centrais, de preferência com orçamentos vinculados aos estados.
Seguindo recomendação do CNJ, além da suspensão das penas de prestação de serviços comunitários e do comparecimento periódico em juízo em 13 capitais (quatro não responderam e a de Aracaju foi criada durante a pandemia), também foram interrompidos os Grupos Reflexivos em cinco das dez capitais que faziam a ação voltada para homens que praticaram violência doméstica e familiar.
Por fim, as visitas presenciais na rede de parceiros do sistema de garantia de direitos sociais foram interrompidas em dez capitais (dois não responderam). Por outro lado, as restrições provocadas pela Covid-19 impulsionaram novos serviços. Centrais como a de Aracaju passaram a realizar contato telefônico com as pessoas em cumprimento de medidas de alternativas penais.
Embora não de forma homogênea e puxada por capitais como Teresina, Fortaleza e Aracaju, também houve a ampliação de 12% no número de pessoas acompanhadas entre 2020 e 2021, passando de 32 mil para 37 mil pessoas. Em algumas capitais, no entanto, houve diminuição do número de acompanhados, como no caso de Belo Horizonte, Curitiba, Salvador e São Paulo.
17 capitais ainda adotaram medidas específicas, incluindo ações como afastar ou colocar em trabalho remoto profissionais que compõem grupo de risco acrescido, disponibilização de equipamento de proteção para funcionários, agendamento de atendimentos e organização de plantão telefônico.
O estudo também apresentou dados sobre o perfil dos atendidos: homens (86,2%), pardos (50,5%) ou pretos (18,4%). Sobre a escolaridade, 33,7% têm ensino fundamental incompleto e 21,6%, o ensino médio completo. Analisando a idade, há uma concentração na faixa entre 18 e 24 anos (26,1%) e de 35 a 59 anos (27,6%).
Porém, há diferenças regionais significativas. Enquanto em Manaus, 64,4% têm entre 18 e 24 anos, Rio de Janeiro tem mais da metade (57%) das pessoas acompanhadas têm entre 35 e 59 anos.
Já as penas alternativas, também conhecidas como restritivas de direitos, incluem limitação de final de semana, prestação de serviços comunitários ou pagamentos de prestações pecuniárias, entre outros. Esses serviços também oferecem atuação de psicólogos e assistentes sociais às pessoas atendidas
As alternativas penais têm resultado em importante mobilização do Executivo federal na última década, inclusive por meio do financiamento de projetos para a implantação das CIAPs. Informações do Departamento Penitenciário Nacional de março de 2022 apontavam 128 Centrais Integradas em 25 capitais, com quase 500 mil atendimentos realizados entre março de 2021 e março de 2022.
Desde 2019, o CNJ vem atuando para apoiar o fortalecimento das alternativas penais por meio do Fazendo Justiça, o que inclui fomento ao fortalecimento das CIAPs, atenção a varas especializadas em alternativas penais, formações, publicações técnicas e inovações tecnológicas, incluindo o módulo de alternativas penais em desenvolvimento no Sistema Eletrônico de Execução Unificado (SEEU), que pretende contribuir para qualificar as informações sobre as alternativas penais no país.
Com informações da assessoria de imprensa do CNJ.
Comentários
Postar um comentário